
O conceito de ánanda, refere-se a um estado de felicidade suprema, uma alegria que transcende as experiências comuns da vida diária. Esta não é uma felicidade efémera, sujeita a altos e baixos, como a que sentimos ao obter algo ou ao satisfazer um desejo momentâneo. Ánanda é uma experiência de uma tranquilidade profunda, uma serenidade imperturbável, que nasce do reconhecimento da nossa essência verdadeira, livre das limitações do mundo exterior e das inquietações da mente.
No Sámkhya, aprendemos que o sofrimento surge da ignorância, do erro de confundirmos a nossa verdadeira essência com o corpo e a mente. De facto, a nossa essência, Purusha, é uma consciência pura, imutável e não influenciada pelas oscilações do mundo material, Prakrti. O Sámkhya ensina que, ao percebermos a diferença entre a nossa verdadeira natureza e o mundo material, experimentamos ánanda, uma felicidade que emana da nossa essência mais profunda e que não depende de circunstâncias externas.
É precisamente aqui que o Yoga se revela como um caminho essencial para atingir esse estado. Através da prática do Yoga — seja pela meditação, pelos ásana ou pelo pránáyáma— começamos a libertar-nos das ilusões que nos prendem à identificação com o corpo e os desejos. Aos poucos, a mente serena, e a nossa atenção volta-se para dentro, para a fonte dessa tranquilidade.
Ao praticarmos o Yoga de forma disciplinada, começamos a dissolver as camadas que nos separam da nossa verdadeira essência. Comprendendo os kosha, a nossa essência está envolta por camadas, como véus que ocultam o nosso verdadeiro ser. A mais subtil destas camadas é o ānanda máyá kosha, que significa “corpo ilusório feito de felicidade”. Esta é a camada mais próxima da nossa verdadeira natureza, e quando a transcendemos, experienciamos a bem-aventurança que não está sujeita às flutuações do mundo.
Para atingir esse estado de ānanda máyá kosha, a prática do Yoga e de todas as suas disciplinas técnicas são indispensáveis. À medida que a mente serena, libertamo-nos das distrações dos sentidos e mergulhamos cada vez mais fundo na nossa própria consciência. Ao transcender as camadas mais superficiais do corpo físico, da mente e do intelecto, chegamos ao ponto em que encontramos o estado de pura felicidade, ánanda. É uma alegria que não depende de nada externo, porque já existe em nós.
No entanto, o caminho não termina aqui. Quando ultrapassamos o ānanda máyá kosha, atingimos Kaivalya, o estado de libertação completa. Neste estado, a consciência liberta-se de todas as influências da mente e do corpo, alcançando uma liberdade plena e imutável. Como explica Vivekánanda, “a verdadeira felicidade não está nos prazeres dos sentidos, mas no estado de unidade com o Absoluto, que é pura paz e bem-aventurança”. Kaivalya é essa libertação final, onde a dualidade desaparece, e onde o ser vive num estado de harmonia perfeita com o universo, em completa tranquilidade.
Ao caminharmos pelo Yoga, somos gradualmente conduzidos a este estado de ánanda. Ao largarmos as identificações com o que é passageiro e efémero, descobrimos que a verdadeira felicidade está dentro de nós, sempre presente, sempre disponível. O Yoga permite-nos remover os véus da ignorância, Máyá, que nos impedem de ver esta verdade. E quando finalmente atingimos Kaivalya, experimentamos a felicidade plena, a liberdade absoluta, e uma serenidade que é imperturbável. Neste estado, vivemos em harmonia com o que somos, em profunda conexão com a vida e o universo. É esta serenidade que o Yoga nos oferece — um retorno à nossa essência, que é e sempre foi, ánanda.